10 ago Comunitários do Marajó aprendem sobre análise financeira simplificada de iniciativas florestais
Computador e planilhas do programa Excel não estão na rotina de atividades do produtor agroextrativista Arnaldo Costa da Silva. Acostumado ao trabalho pesado na floresta, sobra pouco tempo para se dedicar à outras atividades, principalmente as que envolvem tecnologia. Mas foi o sonho de poder desenvolver a região em que mora e proporcionar qualidade de vida que ele viajou mais de doze horas de navio para realizar, em Belém, a oficina de capacitação “Green Value: uma ferramenta para análise financeira simplificada de iniciativas florestais”. A atividade foi desenvolvida nos dias 03 e 04 de agosto, no auditório da sede do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
Arnaldo é morador da comunidade Santíssima Trindade, localizada às margens do rio Aramã Grande, na Reserva Extrativista Mapuá, cujo território pertence ao município de Breves, na região do arquipélago do Marajó. Ele é uma das lideranças que lutam pela implementação do manejo florestal comunitário de uso múltiplo. Apesar de não ter facilidade com o manuseio de computadores, Arnaldo explica que sempre anotou os dados referentes às atividades realizadas por ele em campo, o que é primordial para a análise realizada pela ferramenta. “É sempre interessante aprender coisas novas. O que eu levo comigo desse curso é a possibilidade de olhar para o final da safra dos produtos e saber se toda a produção foi viável, onde preciso melhorar e quanto foi meu custo total”, contou.
A oficina foi promovida pelo Grupo de Trabalho do Manejo Florestal Comunitário do Marajó (GT MFC do Marajó) que congrega instituições do poder público, terceiro setor e movimento social em torno dos debates sobre desenvolvimento sustentável. A Green Value (Valor Verde em português) é uma ferramenta simplificada que permite identificar e avaliar os indicadores e a situação financeira de empreendimentos rurais.
A analista do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e chefe da Resex Terra Grande Pracuúba, em Curralinho e São Sebastião da Boa Vista, Simone Albarado, ressalta que as experiências e as demandas das comunidades representadas serviram como estudo de caso para as atividades práticas do curso. Segundo ela, o Green Value é a ferramenta adequada para a gestão financeira de atividades, como lavoura, fruticultura, piscicultura e manejo do açaí, praticadas por comunidades extrativistas, ribeirinhas e tradicionais da Amazônia. “A razão principal é a simplicidade da ferramenta, de uso fácil por não especialistas”.
Metodologia
Outra vantagem, segundo ela, são as informações geradas, a partir de planilhas, que contribuem para a tomada rápida de decisões sobre o empreendimento analisado. A técnica do ICMBio diz que para funcionar adequadamente é importante que a metodologia integre a experiência e a demanda dos atores econômicos no contexto da cadeia produtiva em que estão inseridos. “É nas Unidades de Conservação de Uso Sustentável que a metodologia está sendo disseminada, por meio das oficinas organizadas pelo GT do Marajó”.
Essa crescente disseminação da metodologia em comunidades amazônicas pode ser explicada pela sua origem: pensada e construída a partir de experiências comunitárias, segundo explicou Ana Carolina Vieira, Coordenadora do Programa Florestas Comunitárias do Instituto Floresta Tropical (IFT), organização não-governamental que anima o GT do Marajó e participou do desenvolvimento da ferramenta.
A metodologia Green Value foi desenvolvida em tese de doutorado da norte-americana Shoana Humphries, com colaboração do Dr. Thomas Holmes, cujo objeto de pesquisa era o Manejo Florestal Comunitário no Brasil e no México. Ao analisar a viabilidade financeira das iniciativas florestais, Shoana constatou, por exemplo, que alguns custos ou não eram incluídos ou eram calculados de forma super ou subvalorizados.
Para a coordenadora do IFT a escolha do Green Value tem base na simplicidade de operacionalização da ferramenta, ao contrário de metodologias empresariais que exigem conhecimentos técnicos. Por ser autoexplicativa e de fácil domínio, a metodologia reúne requisitos para aplicação em projetos agroextrativistas e organizações comunitárias.
A facilidade no manuseio da ferramenta foi o que chamou atenção de Luiz Tenório, morador e presidente da Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Arióca Pruanã (Amoreap). “Tenho acompanhado a agenda de luta dos movimentos sociais da nossa região para estabelecer desenvolvimento e trazer bem-estar. Apprender a manusear essa ferramenta, e compartilhar com os outros companheiros como fazer isso, é uma forma de organizar melhor nosso trabalho. Tenho certeza que é possível colocar em prática na nossa realidade”, argumentou.
Desenvolvida pela Earth Innovation Institute (EII) e o Serviço Florestal dos Estados Unidos a Green Value é uma ferramenta que ajuda os gestores a monitorar e calcular os custos e a renda, negociar preços mais justos, melhorar a gestão financeira e a transparência e fortalecer a sustentabilidade de dos negócios. A Green Value (que significa Valor Verde em inglês) foi desenvolvida originalmente para empresas madeireiras comunitárias no Brasil, mas desde então tem sido usada com muito sucesso em toda a região amazônica e na Guatemala com iniciativas vendendo um variado de produtos e serviços, como a castanha-do-brasil, o artesanato, o turismo e os créditos de carbono.
Uma pesquisa de monitoramento recente realizada pela EII com os participantes das oficinas constatou que 46% dos entrevistados usaram a Green Value para analisar os custos e a renda de 41 produtos e serviços diversos. Além disso, 35% dos entrevistados capacitaram um total de 150 pessoas para usar a Green Value. Os impactos identificados como resultado do uso da Green Value incluem: melhor monitoramento dos custos e da renda; maior transparência; custos reduzidos; renda maior; melhor rentabilidade; melhor processo de tomada de decisões; menos conflitos; melhor viabilidade financeira.
Grupo de Trabalho
Em funcionamento desde 2014, o GT atua na perspectiva de fomentar o desenvolvimento do manejo florestal realizado por populações tradicionais que vivem em Unidades de Conservação de Uso Sustentável (UCs) na região do Marajó. Compõem o grupo o Instituto Floresta Tropical (IFT), Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Empresa Assistência Técnica e Extensão Rural do Pará (Emater-Pa), Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-bio), e INCRA. O grupo conta, ainda, com o apoio da Prefeitura Municipal de Breves.
Os objetivos específicos do GT MFC do Marajó são: oferecer assistência técnica florestal; implementar o manejo florestal e uso múltiplo da floresta; e fortalecer as cadeias de valor de produtos florestais. O grupo foi responsável pelo Encontro de Nivelamento Técnico e Institucional, que elucidou as discussões sobre os procedimentos para o licenciamento do manejo florestal em Unidades de Conservação, previsto na Instrução Normativa Nº 16/2011, do ICMBio; desenvolveu, também, um levantamento das serrarias existentes na Resex Mapuá; realizou um seminário sobre Manejo Florestal Comunitário; organizou a oficina de Capacitação de Conselheiros da Resex Mapuá; e uma Caravana de Sensibilização para o Manejo Florestal Comunitário.
Para saber mais sobre a ferramenta, visite: https://www.green-value.org/inicio-port/
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