01 nov Em paz com a natureza e com as populações dependentes de florestas
Por Marco Lentini
A 16ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Biodiversidade (COP), sediada em Cali, na Colômbia, termina nesta sexta-feira, 1º de novembro, reforçando ao mundo a urgência da conservação da biodiversidade e do enfrentamento às mudanças climáticas para a sobrevivência do planeta. A COP é o evento mais importante da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica (CBD), no qual é esperado que os países avancem em seus compromissos formais para a conservação da diversidade biológica, além do uso sustentável de seus componentes e a partição justa dos benefícios oriundos da utilização dos recursos biológicos e genéticos.
O Brasil, enquanto país signatário da CDB, é um dos principais protagonistas das COPs de diversidade biológica. O país é considerado como uma das 17 principais nações ‘megadiversas’ do planeta, abrigando 116 mil espécies vegetais e ao menos 45 mil espécies animais, distribuídas em cinco biomas que contêm características e particularidades muito distintas entre si. Isto, por outro lado, também significa que estes biomas apresentam pressões e desafios para a proteção de seus ecossistemas e demais ativos biológicos muito particulares.
Falando aqui especificamente da Amazônia, região na qual o Instituto Floresta Tropical ‘Johan Zweede’ (IFT) atua, além dos desafios à proteção de suas florestas e à conservação de sua diversidade biológica, temos a importância estratégica desta região em um outro tema de crucial importância para o futuro da humanidade: a crise climática. Os eventos climático extremos, que foram de especial relevância para os brasileiros neste ano de 2024, em decorrência de tempestades e enchentes no sul do país e a seca extrema e persistente na maior parte restante do país, irão se agravar caso nossa sociedade falhe em diminuir o ritmo de desmatamento de biomas importantes como a Amazônia, que ainda está na casa de 900 mil campos de futebol ao ano.
Proteção da biodiversidade passa por ações de manejo florestal
As florestas serão determinantes nas soluções brasileiras para o futuro, seja devido às questões climáticas ou de proteção de sua diversidade biológica. Temos um ativo florestal de imensa magnitude, que não pode ser perdido. Se for, o modo de vida da sociedade brasileira e mesmo da humanidade pode ser severamente afetado. Embora entendamos que o comando e controle para diminuir o desmatamento e a degradação dos biomas brasileiros seja importante, o principal desafio posto à mesa se refere a como desenvolver uma nova economia com base na conservação das florestas e no uso racional da diversidade biológica.
Não por acaso, uma parcela significativa das atuais metas para a proteção da biodiversidade biológica (através do Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal, ou KM-GBF), que deverá ser materializado pelos países signatários através de um plano chamado de Estratégias e Planos de Ação Nacionais para a Biodiversidade (EPANB), passam por ações de restauração ou de manejo de suas florestas. Algumas destas metas, além disso, focam no fortalecimento da capacidade e da participação dos povos indígenas, das comunidades locais e das mulheres nas estratégias de proteção da diversidade biológica.
Um dos principais modos de atingir esta missão é ganhar escala nos projetos, programas e iniciativas voltados a estruturação de cadeias produtivas locais e do manejo florestal comunitário e familiar promovido pelas comunidades tradicionais vivendo nas áreas rurais dos biomas brasileiros. Enquanto tais populações servem frequentemente como os guardiões das florestas, prevenindo a sua invasão para a condução de atividades ilegais (desmatamento, grilagem, garimpo, entre outros), também estão entre os grupos mais expostos às desigualdades sociais e ao baixo acesso a políticas públicas voltadas a saúde, educação e segurança alimentar. Ou seja, apoiar tais grupos em atividades produtivas alinhadas com a conservação das florestas e de seus ativos biológicos, além de apoiar uma nova economia brasileira, pode corrigir algumas desigualdades sociais históricas às quais tais pessoas foram submetidas no passado.
O lema desta COP 16 é “Paz com a Natureza”. De fato, ao longo da história, existam talvez exemplos demais da humanidade aparentar estar em guerra com a natureza. Já entrando no 2º quarto do século XXI, a ciência demonstra que replicar tais exemplos provavelmente levará a humanidade para a extinção. O Brasil pode e deve dar o exemplo, por ser um gigante florestal, por conter grande parte da diversidade biológica do planeta, e por ter todas as ferramentas necessárias hoje para trazer conforto para a sociedade e para as populações rurais a partir do uso responsável destes ativos.
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Marco Lentini é engenheiro florestal e secretário executivo do Instituto Floresta Tropical Johan Zweede (IFT)
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